meus homens ao mar
eu sempre amei o mar.
desde que criei consciência me sinto bem com cheiro de sal. na infância, passava horas procurando conchas, aproveitando a sensação de enfiar os dedos dos pés na areia. tudo me era curioso: as pernas de moça, as estrelas do mar, siris e corruptos. um universo à parte do qual sempre pertenci.
meu pai é o maior fã de mar que eu conheço. gosta das ondas, admira a calmaria de um mar tranquilo. "olha que piscininha!" ou "hoje o bicho está bravo!". não importa como o mar se apresente, meu pai o respeita. se fascina. foi na companhia dos pés de meu pai e na segurança de suas mãos que fui apresentada ao mar. foi sob seu olhar atento que peguei jacarés, furei onda. é naquela imensidão que melhor exercemos o papel de pai e filha. "vamos dar um mergulho?". a resposta sempre foi sim.
na adolescência comecei a achar no mar minha maior conexão direta com Deus. no vaivém de suas ondas passei a recarregar minhas forças, fazer pedidos, pedindo licença, agradecer. transformei-o em lugar santo. "livrai-me de todo mal, amém". minha igreja.
e então eu o encontrei. o capitão que me tirou do cais, o meu amor em forma de paz. mal pude conter a empolgação a primeira vez que ele perguntou se eu queria entrar. "vamos dar um mergulho?". era ele! eu sabia que era ele! não à toa, dissemos nosso primeiro eu te amo recíproco dentro de um navio, sob aquela imensidão. e seguimos desbravando praias desde então, batizando-nos entre um beijo e uma onda de sal. foi com ele que entendi como o mar pode ser doce.
neste janeiro,porém, o momento mais especial aconteceu enquanto eu estava na areia, ali, no mesmo posto que sempre pertenceu a minha mãe e irmã. com um livro na mão e sentindo o vento embaraçando meu cabelo, esperando o sol ir embora, me vi olhando para o mar. estava um dia lindo, o mar parecia tão limpo e eu estava esperando só um convite para entrar. mas antes mesmo de me levantar da cadeira e chamá-los, tomada de iniciativa, eu parei e os vi. meu pai. meu amor. e os vi não como se vê normalmente,mas como se enxerga de verdade. estavam os dois fazendo os últimos retoques da isca que ia na vara, em plena sintonia. agitaram seus bonés e então veio o convite em forma de olhar. "você vem?", me perguntaram os dois. eu disse que não, também com os olhos. as quatro sobrancelhas se juntaram, em dúvida. "por que não?", mais uma vez elas disseram sem dizer.
_ daqui a pouco - me permiti responder. queria fotografar os dois indo, contar seus passos. meu começo e meu fim. admirar. agradecer. dá pra rezar fora da igreja, pensei, enquanto ambos iam a caminho do mar.
Comentários
Lembrou Neruda e seu amor pelo mar.
Beijos.
Texto lindo!
Beijos!
Beijos,
Mafê.
Beijos! =**
Lamento muito minha cidade não ser litorânea e invejo a conexão com o mar que algumas pessoas puderam ter .-.
Abraço!
semfloreio.blogspot.com
[]s
Mas também venero essa conexão com a natureza.
Muitoooo tempo sem passar por aqui e até mesmo pelo meu blog. É sempre bom voltar a esse universo =)
Bjs