o mistério da casa ao lado
moro no mesmo lugar
há mais de dez anos.
praticamente cresci
aqui, vendo as reformas transformarem o portão antigo e vinho da minha casa em
um automático e branco, os tijolinhos laranja virarem pedras canjiquinha, o
piso vermelho cor de barro se tornar um simpático anti-aderente bege. a casa
mudou junto comigo e é sempre agradável notar suas mudanças. curiosamente, a
casa ao lado permanece intacta: a mesma porta de madeira, o corredor com piso
cinza, o portão pequeno sempre aberto, o grande portão grafite com os mesmos
ruídos para a entrada e saída de sempre. as pessoas continuam as mesmas, com
alguns acréscimos, uma vez que alguns dos meninos cresceram, e grande parte
deles já tem suas namoradas. além disso, os filhos dos patronos da casa já se
casaram, e já deram alguns netos para aumentar a família. são mais dois
meninos. há algo de misterioso dentro dessa casa. as pessoas que moram nela não
envelhecem nunca, mantém uma interessante mania feliz de viver, e são muito
amorosos e íntimos uns com os outros ainda que se xinguem grande parte do
tempo. há música por toda a parte, uma cumplicidade bonita de se ver e uma
personalidade mais carismática que a outra, eu não conseguiria me decidir por
só um. há festa todo final de semana, há sempre um pretexto para que eles
comemorem algo, o jogo ganho, o perdido, o aniversário de um, o casamento de
outro. já me perguntei se seria a atmosfera do lugar, já que mesmo os amigos próximos
(deles) e desconhecidos (para mim) quando dentro da casa também são contagiados
por gargalhadas de perder o fôlego. também já me perguntei se eles cultivam
alguma planta específica, a qual utilizam para fazer chá diário, uma vez que da
minha janela do quarto posso sempre vê-los com xicrinhas nas mãos em volta da
mesa da cozinha. por fim, minha última idéia foi que talvez fosse genético, uma
vez que as crianças já apresentam o mesmo comprtamento assim tão novinhas, mas
mesmo esse pensamento caiu por terra, uma vez que os cunhados e namorados, os
chamados agregados, compartilham das mesmas características. quanto à tal da
erva misteriosa, nunca vi nenhuma ali plantada que levantasse suspeita e quanto
à atmosfera local: caramba, nossas casas são vizinhas, como não passaria pra
cá?
enquanto fico aqui sentada, digitando essas palavras, sinto uma felicidade no coração ao ouvi-los gritando "ah, fulana vai ver se eu tô na esquina", "ô filho, você fez isso pra mim?", "alguém tira o carro do cicrano pra mamãe entrar?". eu poderia lamentar que a acústica de nossas casas fosse tão boa. mas honestamente? festejo.
Comentários
Qualquer dia desses, vou externalizar o que penso da minha ruazinha sem saída.
è, acho que ao lado há um lar, daqueles que é legal estar ao lado.
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